É comum em assentamentos rurais ocorrer disputa de posse entre particulares, seja pelos limites entre imóveis inserto nas terras públicas ou a posse total de determinado imóvel parte do assentamento.
Recentemente nos deparamos com uma reintegração de posse deferida. A reintegração de posse foi a disputa entre particulares pela posse de um imóvel inserto no assentamento administrado pelo INCRA. Por lógica, o vencedor da demanda possessória obteve a declaração judicial de ser o verdadeiro possuidor do imóvel.
Vale lembrar que o instituto da posse é completamente diverso da propriedade em si, embora alguns requisitos sejam comuns nem sempre o possuidor é proprietário.
Enquanto a propriedade tem seu conceito básico no registro do título no cartório de registro de imóveis, em regra, registro da escritura pública na matrícula do imóvel, a posse, por sua vez, é o exercício no plano fático de alguns dos atributos da propriedade.
O possuidor, no conceito da posse, não consta registrado na matrícula do imóvel como proprietário ou adquirente, tão somente exerce atos da posse: usa, goza, usufrui, efetua benfeitorias, tudo como se dono fosse.
Em determinadas situações é possível a regularização da posse em propriedade, para isso há instrumentos jurídicos específicos como usucapião, procedimentos da REURB e entre outros
Voltando ao tema proposto, quando há disputa de posse entre particulares sobre parte do assentamento, observa-se regulamento com previsões especificas, nesse sentido, o art. 7º, §2º do Decreto 10.592/2020:
Art. 7º Identificada a existência de disputas acerca dos limites das ocupações, o órgão competente poderá buscar estabelecer acordo entre as partes, observado o disposto no art. 8º da Lei nº 11.952, de 2009.
§ 1º Se for estabelecido acordo entre as partes, estas assinarão declaração para validar a concordância quanto aos limites demarcados.
§ 2º Se não houver acordo entre as partes, a regularização das ocupações será suspensa para decisão administrativa, nos termos estabelecidos em procedimento definido pelo Incra.
O procedimento para regularização fundiária é definido na instrução normativa 104 do INCRA.
Art. 23. Identificada a existência de disputas em relação ao imóvel ou aos limites das ocupações, o Incra poderá buscar acordo entre as partes.
§ 1º Se for estabelecido acordo entre as partes, estas assinarão declaração, conforme anexo VII desta Instrução, para validar a concordância quanto aos limites demarcados.
§ 2º Sendo infrutífera a conciliação, a regularização das ocupações será suspensa para decisão administrativa, observado o seguinte:
I – se o conflito for entre comunidades locais e particulares, o Incra decidirá em benefício das comunidades locais, definidas no inciso X do art. 3º da Lei n° 11.284, de 2006; e
II – se o conflito for entre particulares, a demanda somente prosseguirá após acordo ou decisão judicial.
§ 3º Havendo disputa judicial entre particulares pela posse da ocupação, o processo de regularização fundiária será suspenso até a prolação de decisão pelo juízo, prosseguindo a instrução do processo de regularização em nome do vencedor da demanda.
§ 4º Na hipótese de ocorrência do § 2º, inciso II, e do § 3º deste artigo, o Incra procederá o bloqueio das áreas em litígio nas soluções de tecnologia da informação e comunicação – TIC, adotadas pela Autarquia.
§ 5º Na pendência de disputa judicial, havendo acordo extrajudicial entre as partes, este deverá ser comunicado ao juízo competente.
§ 6º Havendo extinção do processo judicial, será dado prosseguimento ao processo administrativo de regularização fundiária.
§ 7º Não serão regularizadas ocupações que incidam sobre áreas objeto de demanda judicial até o trânsito em julgado da decisão, ressalvadas a hipótese de o objeto da demanda não impedir a análise da regularização da ocupação pelo Incra e a hipótese de acordo judicial.
O primeiro passo do órgão competente é buscar estabelecer acordo pacífico entre as partes, com a finalidade de viabilizar a regularização fundiária.
Mas o acordo nem sempre é entabulado, ante os conflitos possessórios, situação que leva a judicialização.
Sem acordo, portanto, a regularização deve respeitar o que dispõe o art. 23, §3º, da Instrução Normativa 104 do INCRA.
Assim, temos uma regra clara e específica: “Havendo disputa judicial entre particulares pela posse da ocupação, o processo de regularização fundiária será suspenso até a prolação de decisão pelo juízo, prosseguindo a instrução do processo de regularização em nome do vencedor da demanda”.
Com efeito, não é possível o INCRA definir qual dos litigantes particulares em conflito possessório deve ser beneficiário da reforma agrária, ou seja, há um limite estabelecido pela instrução normativa 104, em tese, o INCRA deve se curvar para a decisão judicial que reconhece qual litigante é possuidor do imóvel inserto no assentamento rural.